apaixonar-se por catamarca

bíen! cheguei, passei dois dias em Santa María e já estava apaixonada por Catamarca. não me lembro quem me havia dito que em Catamarca a gente não está muito metida no lance do turismo, e que te tratam um pouco como um visitante amigo mais do que como uma máquina de cuspir dinheiro. no dia seguinte à minha chegada resolvi fazer a caminhada do Cerro Pintado, as ruínas de um pucará a uns 3 km de Santa María, num lugar chamado Las Mojarras. a dona do hostel me levou até um ponto do caminho e me indicou o percurso. desci ao rio por um caminho que o cruza em direção à ruta 40 do outro lado. passei por lhamas. tomei à direita na rodovia e andei mais um quilômetro até a entrada do morro. quis encontrar um banheiro e me indicaram a casa do señor Cruz, responsável pela manutenção do sítio arqueológico. a família toda me recebeu com simpatia e um copo de refrigerante gelado. disse que me acompanharia até lá em cima. eu perguntei quando me custaria porque né, poca plata mas ele garantiu que não era pra me preocupar e que podia pagar quando quisesse e quando pudesse e que não cobrava pelo serviço. subimos junto mais os três cachorros que estavam mui contentes pela companhia.

pelo caminho ele me ia contando do vale e das construções, das casas que agora ocupavam o vale, do tipo de agricultura, de como os vigias daquele tempo pré-espanhol e pré-inca se posicionavam pra ouvir a aproximação dos inimigos. me contou mais um pouco sobre os cardones (estou ficando especialista em cardones) e sobre as outras plantas que dominam a região. lá no topo fomos até uma casinha que a mais intacta de todas e que também os arqueólogos não sabem bem para que servia.

de lá se vê bem todo o vale e mais uma vez pensei um pouco triste que algo nos valles Calchaquíes me atrai, e que algo no norte argentino me fez me sentir um tanto quanto em casa. e que agora estava rumando ao sul e não sabia se por lá encontraria algo parecido. ali sentados comemos bolachinhas salgadas e dividimos uma pêra, e o señor Cruz falou por uns bons minutos sobre a bíblia e os ensinamentos de Jesus Cristo e o verdadeiro deus. descemos fazendo a volta pelas ruínas das casas.

de volta ele me pediu pra assinar o livro de visitas e eu já tinha fome; estava pensando no tamanho da chance de encontrar algo aberto ainda àquela hora de quase siesta sem precisar me meter demais pro centro de Santa María, o que significaria me afastar do camping. vem o señor Cruz e me diz que sua mãe me está convidando pra comer algo antes de ir. disse que não queria incomodar etc. mas também a gente tem que saber a hora de aceitar quando o convite é feito com coração e boa vontade. almocei com ele um macarrão com frango que bem vinha a calhar depois daquela caminhadinha. ele falou mais um pouco sobre Jesus Cristo e a mãe dele me trouxe umas revistinhas das Testemunhas de Jeová pra eu ler enquanto descansava. fui embora quando umas nuvens ruidosas começaram a tomar o céu. deixei algo de dinheiro como agradecimento pelo trabalho de guia e manutenção do sítio mas a verdade é que ele de fato não fez nada daquilo esperando que eu lhe pagasse qualquer coisa. estava mais interessado em me contar sobre Jesus Cristo e a verdade de deus. de volta ao camping passei a tarde tomando mate com a dona da hospedagem enquanto ela pintava umas portas de madeira, conversando sobre essas estranhas contradições das religiões (o señor Cruz e essa compaixão seletiva que exclui quem não segue o único deus verdadeiro) e outros assuntos mais ou menos filosóficos. à noite ela me convidou pra umas pizzas na casa dela e ajudei picando cebola e tomate. isso tudo e mais umas conversas por e-mail com um argentino viajante que conheci em La Rioja e me deu várias dicas sobre o norte argentino, e que agora está em Antofagasta de la Sierra, no norte catamarquenho; essa província metida quase toda na puna, meio esquecida pelos circuitos turísticos do norte argentino; talvez seja sorte toda essa gente buena onda que topei, mas veja que Santa María como porta de entrada de Catamarca serviu pra deixar uma ótima impressão e vontade de seguir adiante rumo à puna outra vez.

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