missão-viagem a cachi

ônibus de La Quiaca a Salta saía meia-noite. fiquei tranquila no hostel até onze e qualquer coisa, e fui caminhando até a rodoviária. (porque todos sempre dizem que fronteira é fronteira, e é sempre perigoso, e melhor não chegar de noite etc etc. mentira. La Quiaca é uma cidadezinha pequena de puna que por acaso tem um paso internacional. as ruas tranquilas mesmo pela noite quando a iluminação não é das melhores.) a rodoviária pequenina mas um caos de gente. ia sair um ônibus a Buenos Aires, outro a não sei onde, um monte de malas e sacolas por todos os lados. o meu ônibus tinha estragado no meio do caminho e precisava vir o outro e ia demorar pelo menos meia hora mais. foi esfriando. no ônibus pra Buenos Aires o motorista argumentava com um casal mui humilde de velhinhos que eles não podiam levar tanta bagagem, e nesse caso deviam despachar algumas coisas como encomenda, e pagar à parte, e é assim que funciona, e apontava minha mochila e dizia que assim tem que ser a bagagem, não aquilo. de fato os dois tinham mais ou menos toda a casa empacotada e ensacada e ainda a bagagem de mão eram umas cinco sacolas grandes. os velhinhos foram convencidos de despachar parte daquele monte de tralha como encomenda que ia chegar depois em Buenos Aires, em outro ônibus. fiquei imaginando como seria chegar com tudo aquilo no Retiro, a rodoviária central da capital; a bagunça que é aquele lugar, a quantidade de gente meu deus. e como iam fazer pra meter tanta coisa num táxi, num trem, nonde fosse? ou os esperava um filho ou qualquer parente com uma caminhoneta? aonde iam com tanta coisa? enfim embarcaram, se foi o ônibus com destino a Buenos Aires.

mais uns minutos e chegaria o meu, com destino a Salta. deixo a mochila no bagageiro e subo ao meu lugar na frente, ao lado de um senhor que mal se sentou já roncava. atrás de mim veio uma senhora com uma bolsa do tamanho do universo, e ia tirando coisa e espalhando pelos bagageiros de cima dos bancos, e meu deus que tanto levam essas senhoras com suas bolsas gigantes? sei que ao final se acomodou com a bolsa no corredor e de lá tirou uma manta, um cachecol, cobriu as pernas e as apoiou sobre a bolsa. finalmente pude reclinar o banco e me fazer de turista dormida. a questão é que nessa viagem de quase oito horas o ônibus foi parado pela polícia e/ou gendarmería nacional umas quatro vezes. e sobe polícia, sobe soldado, pergunta se quem é esse e aquele pacote, manda abrir bagageiro, fecha bagageiro, agradece o motorista, tchau. meia dúzia de quilômetro depois mais polícia, mais tempo perdido. algo dormi. chegamos em Salta passadas as oito horas, depois de um trânsitozinho na entrada da cidade. o ônibus pra Cachi tinha saído às sete e o próximo só saía às oito da noite. em Salta (e San Salvador de Jujuy, por onde também passamos) havia chovido e estava um tempinho úmido de ressaca de tempestade. me lembrei do tal senhor que foi conversando comigo no táxi a Yavi, que me disse que há muitos remises que fazem o caminho Salta-Cachi por um preço similar ao do ônibus. que bastava sair da rodoviária que estariam ali esperando. claro que não estavam esperando coisa nenhuma, e caminhei até um posto de gasolina próximo pra perguntar a um frentista se ele tinha ouvido algo parecido. ele me passou um número de telefone. era de uma empresa de remises que fazia esse serviço capital-interior. chamei e ia sair um remis dali uma hora. podia esperar no mesmo posto de gasolina que passavam pra me buscar. nem perguntei o preço. esperei ali sentada conversando às vezes com o frentista que me tinha passado o número; mais o que fiz foi observar a quantidade de vezes que jogavam água no chão e passavam o rodo, sem parar. o remis enfim veio, e depois ainda deu voltas pra buscar mais gente, pra comprar folha de coca, pra comprar um refrigerante etc. também eu comprei umas bolachinhas porque vai vendo que já eram onze da manhã e eu tinha só comido duas medialunas na rodoviária. a viagem pra Cachi é longa e sinuosa. um caminho lindo que se mete por uma quebrada e em um momento começa a subida que é a cuesta del Obispo. mas a cuesta del Obispo eu não vi nada porque quando mais subíamos mais o tempo fechava até que estávamos metidos numa neblina violenta, de não ver um metro adiante. e curva, muita curva. quando acabaram as curvas e a estrada volta a descer se entra num pedaço que se chama reta de tintin, e que é, bueno, uma longa reta rodeada por cardones gigantes e montanhas coloridas principalmente ao lado esquerdo. a neblina foi se dissipando pra dar lugar a um tempo seco mais condizente com o que eu estava encontrando pelo norte até ali. Cachi está a 2200m de altitude; muitos atletas vão treinar e correr ali, porque teoricamente é a altitude ideal pra melhorar marcas sem que o desempenho seja prejudicado. depois da longa reta tomamos à esquerda na ruta 40, que pode ser a rodovia mais longa e importante e mítica da Argentina mas que ali não tinha asfalto e parecia qualquer coisa menos uma rodovia que corta todo o país de norte a sul.

mencionei o lugar em que queria me hospedar e o remisero me deixou na porta. a viagem me custou 100 pesos, afinal, que são só 25 a mais do que o preço do ônibus, e me pareceu bastante justo. entrei no hostal e fui mui bem recepcionada pelo señor Oscar, que me indicou o quarto e me apresentou pro Matias um corredor que estava no povoado fazia um mês treinando pra uma maratona que ia acontecer em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia. o hostal não tinha internet mas o senhor Oscar me passou a senha do wifi do hotel na esquina e é só ir até uma árvore grande ali em frente que se pode alcançar o sinal. eu estava era bem cansada de tanta estrada; fui ao lado comer umas empanadas (empanada de queijo de cabra: genial) e quando voltei acabei capotando numa siesta tardia antes mesmo de conseguir a coragem pra tomar o banho que me tinha faltado no dia anterior.

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